A saudade, por onde quer que olhe, passou a estar nas palavras e também no silêncio do vendedor de churros Valdemir dos Santos, de 54 anos. O maceioense, morador do bairro do Flexal de Cima, que sofre com isolamento socioeconômico pela desocupação causada pelo desastre da Braskem, tem a casa e a vida com rachaduras desde 2018.
No dia 3 de março daquele ano, houve o primeiro tremor de terra causado pela exploração de sal-gema pela mineradora. Mais do que as rachaduras em espaços da casa, um impacto tem sido ainda mais difícil de lidar: o econômico, quase sete anos depois que a vida virou pelo avesso.
“Somos vítimas do crime ambiental da Braskem. Mais de 2,5 mil famílias saíram daqui. Isso causou um grande impacto para nós”, afirmou Valdemir em entrevista à Agência Brasil. Ele diz que não aceitou a indenização oferecida pela mineradora, de R$ 25 mil.
Tremores fizeram com que moradores de cinco bairros da cidade tivessem que deixar suas casas. O Flexal, que fica no meio do caminho entre essas comunidades, agora tem a aparência de “bairro-fantasma”.
Histórias como a de pessoas como Valdemir, que permanecem em suas residências e vítimas do desastre causado pela mineradora em Maceió, têm destaque no filme documentário “Ainda há moradores aqui”, de 42 minutos de duração.
A obra será lançada nesta terça (25), às 19h, no Teatro Deodoro, em Maceió. Um debate com moradores de áreas atingidas sucederá a exibição. O filme tem a direção de Tiago Rodrigues. Ele avalia que a maior parte dos brasileiros desconhece a gravidade, as causas e consequências desse crime.
Para evitar que o desastre seja esquecido, ele entende que o filme pode contribuir com a memória do país. “Dar rosto e voz às vítimas desse crime perpetrado por uma grande mineradora”, afirmou. A estimativa é que o desastre afetou diretamente 15 mil residências e 60 mil pessoas da região.
Um dos roteiristas, Maurício Macedo, diz que o filme foi gravado no segundo semestre do ano passado. Acrescenta que um dos contextos que mais chamaram a atenção da equipe realizadora foi o abalo psicológico, incluindo situações que evoluíram para doenças como depressão que afetem os moradores do local.
Ele lembra que pessoas que saíram de casa e tinham mais de 30 anos de história no local receberam a mesma indenização de quem morava havia bem menos tempo.
“A situação de cada família não foi individualizada. No caso do bairro dos Flexais (como é o caso de Valdemir), eles estão isolados. Esses moradores tiveram um abalo emocional muito forte”, afirma o roteirista.